Cessão Fiduciária de Recebíveis e um conserto muito mal feito

Por João Antônio Motta

Havia uma vulnerabilidade na cessão fiduciária de recebíveis, a popular conta garantida, quando a mesma empresa cedia a diversos bancos as mesmas vendas. Obviamente alguém poderia ficar a descoberto se as vendas não fossem suficientes para pagamento de todas as operações de crédito. Da mesma sorte, travando determinado cartão com uma operação bancária, o cliente mesmo vendendo mais que o crédito garantido, não poderia obter mais crédito sobre o cartão travado.

Em decorrência disso, foi implementado pelo BANCO CENTRAL uma “Registradora” (Circular 3.952/2019 e Resolução 4.734/2019) onde há um cadastro denominado “Unidade de Recebível – UR”,  que visa regularizar e eliminar este risco aos bancos, administrando uma agenda de recebíveis futuros entre cessionários (empresas), os bancos e as adquirentes (administradoras de cartões).

Ocorre que uma cliente foi surpreendida semana passada com a retenção dos recebíveis dos seus cartões de crédito e, procurando o banco, o mesmo informou que isso se deve ao sistema “Central de Gravâmes”. Onde a administradora de cartões retém os valores a fim de uma vez por mês liberá-los, restando assim uma “Conta Gravâme” com créditos e a conta-corrente na agência devedora, gerando juros da conta garantida quando há crédito na referida “Conta Gravâme”.

Ora, há muitos anos o Banco Central determinava em seu Manual de Normas e Instruções que era proibido “provocar a elevação, direta ou indireta, das taxas de juros” (MNI-BACEN 16.7.2.2.a).  Da mesma forma, era e é determinado que as cobranças realizadas pelos títulos ou documentos em garantias de empréstimos devem ser lançados em pagamento até o final do dia útil imediato ao recebimento dos valores pelo banco, de forma a “não reduzir os fundos disponíveis do mutuário” (MNI – BACEN, 16.9.2.3). 

Não bastasse, há uma norma mais clara ainda: “Os saldos credores apresentados pelas contas de empréstimos devem ser transferidos para título contábil específico do grupamento de depósitos, na data de sua ocorrência” (MNI – BACEN, 16.9.2.4). 

Isso quer dizer que o “floating” realizado pela administradora de cartões, impedindo a empresa de realizar o pagamento dos empréstimos de sua responsabilidade é francamente indevido, sendo não menos claro que tal sistemática vai afetar todos os clientes bancários que têm cessão fiduciária de recebíveis em garantia dos empréstimos, pois vão ter de usar liquidez própria – que evidentemente não têm – ou recursos do cheque empresarial, o que vai de encontro às normas e princípios acima antes alinhados. 

É certo que os atores neste cenário, banco e administradora de cartões, recebendo os valores dos títulos e documentos em cobrança e estando garantindo empréstimos, devem sem demora colocar o dinheiro recebido em pagamento do empréstimo respectivo, sob pena de multiplicarem problemas quando o foco é apresentar soluções de crédito. 

Por isso, a cliente apresentou reclamação junto ao BANCO CENTRAL para revisão destes procedimentos, a fim de que os valores dos seus créditos sejam, sem demora, acolhidos para os pagamentos de empréstimos que garantem, evitando a elevação indireta dos juros destas operações e, ainda, a necessidade de tomar recursos da conta garantida, o que é o pior cenário a quem já utiliza recebíveis para adiantar capital de giro.

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