Aplicar R$ 1.500 e ficar só com R$ 1.200? Isso é título de capitalização

 De acordo com os números divulgados pela SUSEP (Superintendência de Seguros Privados), em dezembro de 2017 os brasileiros deixaram o montante de R$ 20,78 bilhões em título de capitalização que, na verdade, não é um investimento mas uma aposta, um jogo. 

Esta aplicação é uma das operações mais rentáveis aos bancos e demais empresas operadoras. Parte da quantia empregada vai para o cálculo de juros, outra parte é destinada a compor o fundo de sorteio e outro montante destina-se ao banco como taxa de administração. 

Em resumo e a grosso modo: de cada cem reais que você se dispõe a aplicar, dez ficam com o banco, dez compõem o fundo para sorteio e oitenta compõem o capital que, acrescido dos juros – iguais aos da caderneta de poupança – retornarão quando for possível o resgate. 

Sim, quando for possível o resgate. Geralmente nos primeiros 12 meses é proibido qualquer resgate e, depois desse período, só é possível liberar percentuais estipulados previamente em contrato, até chegar próximo ao final do plano, quando o banco possibilita o resgate de 100% da aplicação. 

Como você pode ver, esta modalidade de aplicação, apesar de ter como remuneração os mesmos percentuais de juros da caderneta de poupança, não é a mesma coisa. Aliás, nem é parecida, pois você terá retorno apenas de parte do que entregou ao banco e com os menores juros do mercado. Acontece que a caderneta de poupança não tem imposto de renda e no título de capitalização pode haver a existência de alíquota de até 30%, se você for sorteado. 

Enfim, é incompreensível como os brasileiros entregaram quase R$ 21 bilhões de suas economias a uma aplicação que sequer retorna o valor do dinheiro entregue ao banco. Diz-se “poupança programada” para quem não tem disciplina em poupar: bobagem, basta colocar o valor que você quer poupar em débito automático. Diz-se “vantagem de sorteio”: outra bobagem, pois quem em sã consciência vai pagar alguém para administrar suas apostas, pois você paga ao banco – e caro – para administrar a loteria com seu número, seu “elemento sorteável”. 

 É evidente que esta aplicação é um desastre ao aplicador, mas, como afirmamos, pode ficar pior já que geralmente o gerente do banco procura enfiar esta aplicação goela abaixo dos clientes como um “pedido de reciprocidade”, para “ajudá-lo no cumprimento de metas”. Até aí tudo bem, pois você pode negociar com o gerente um pacote menor de tarifas ou ainda uma isenção na conta corrente. 

A situação passa a ser desastrosa quando você, eternamente pendurado entre a diferença do contra-cheque e os boletos que se vencem, procura o gerente, seu “bom amigo”, para solicitar um “papagaio”: aquele empréstimo que vai lhe ajudar a vencer a montanha de boletos que o correio insiste em trazer. 

Nesta hora, exatamente neste momento, que o gerente puxa da cartola o titulo de capitalização, mencionando ainda que você o ajudará a cumprir a meta de venda e, ainda, poderá ser sorteado em uma bolada, o que resolverá todos os seus problemas financeiros. 

Além desta prática ser proibida pelo Código do Consumidor, por configurar “venda casada” (aquela condição de compra pelo banco do que você não precisa para adquirir aquilo que você precisa), é terminantemente vedada pelo Banco Central por implicar no aumento 

indireto nas taxas de juros do empréstimo, levando o cliente a passos largos para a inadimplência. 

Como por exemplo: você precisou de R$ 5 mil e conseguiu 24 meses para pagar com uma taxa fixa de 2,5% ao mês. Sua prestação mensal será de R$ 279,56. Mas, para obter este empréstimo com esta taxa espetacular você teve de comprar um título de capitalização de R$ 1.500,00 com 60 pagamentos mensais de R$ 25,00. Uma ninharia que, você avalia, não vai fazer falta. Certo? 

Errado! E bem errado. Sua taxa de juros foi para 3,29% ao mês e – você lembra que só no final pode retirar 80% do capital empregado? – só quando completar os 60 meses você terá R$ 1.200,00 mais a TR. 

Como dissemos: o que é ruim pode ficar pior! Fuja do título de capitalização e, se for solicitado pelo gerente a compra de um para liberar um empréstimo, lembre-se que o Banco Central tem uma ouvidoria justamente para acatar e investigar este tipo de desvio. 

Artigo publicado no Blog João Antônio Motta – UOL Economia – 19/02/2018

Comprar a TV que não precisa com o dinheiro que não tem: superendividamento

 A palavra é comprida, trava a língua, mas o resultado você vê imediatamente com seu nome incluído nos órgãos de proteção ao crédito: superendividamento. Basicamente nós somos diariamente bombardeados com propagandas para comprar isso ou aquilo e, certamente, determinadas marcas ou produtos têm um apelo irresistível. Mas, sem dar um passo atrás, sem respirar e pensar melhor, vamos comprar a TV de que não precisamos com o dinheiro que não temos. 

E é fácil consumir como se não houvesse amanhã, pois o crédito para a compra de produtos – de torradeiras aos carros importados – não é difícil de obter. Basta que a sua renda seja compatível e que o produto fique como garantia ao crédito concedido. Aliás, os bancos dão o crédito focados apenas em como poderão vender o produto recebido como garantia. 

Esta facilidade na obtenção do crédito é extremamente benéfica a todos se, e apenas se, esta facilidade andar junto com consumo consciente e forte divulgação de princípios de educação financeira. O lado escuro do crédito fácil e consumo exagerado é a inadimplência e o superendividamento, que é contrair dívidas além da sua capacidade de pagamento, podendo até mesmo comprometer suas necessidades básicas, como moradia e alimentação. 

Veja o caso do cartão de crédito. Este importante meio de pagamento envolve uma empresa administradora ou um banco, onde as operações representam uma carteira, o lojista e você. Assim, você paga o lojista com o cartão de plástico que, autorizado pelo banco, receberá depois o pagamento e, mais tarde, você realizará o pagamento pelo boleto do cartão. Suas compras serão agrupadas em um único vencimento e isso facilita – e muito – a sua vida. 

 Acontece que no vencimento do boleto, se você não pagar o valor devido e iniciar uma “rolagem” (quando adiamos o pagamento) do saldo devedor, estará às portas do desastre. Segundo divulgado pelo Banco Central, a taxa média do crédito rotativo em cartões de crédito, para o período de 31/01/2018 a 06/02/2018 está em 11,78% ao mês. Isso quer dizer que se você adiou o pagamento de R$ 1 mil, no segundo mês estará devendo R$ 1.117,80 e, no terceiro mês, já estará em R$ 1.249,48. Não precisa ser especialista em matemática para ver o tamanho do problema. Se a taxa não subir, em 10 meses você estaria devendo R$ 2.724,45. É que em janeiro de 2017, para reduzir o excesso de dívidas, o Banco Central editou uma norma que determina aos bancos a “rolagem” do saldo devedor do cartão de crédito em uma carteira mais vantajosa aos consumidores. O que vale dizer que você vai sair do absurdo da taxa de crédito de 11,78% ao mês para algo em torno de 8% ao mês. A questão é: se afogar em 8 metros de água ou 12 metros? O resultado é o mesmo: o seu desastre financeiro. 

Mas qual a solução? Não há mágica possível. O consumo não deve ter por análise apenas se a prestação cabe em seu salário, mas sim se a compra é mesmo necessária e, principalmente, quanto você irá pagar de juros para isso. Juros é o preço que você paga para antecipar o futuro e este preço não pode ser um sacrifício tão grande a ponto de você perder as vantagens da compra e sacrificar o próprio futuro. 

Porém, se você já está com o problema criado, já está devendo o que tem e o que não tem, fique calmo! Junte todos os comprovantes de quanto você recebe e vá negociar com o banco ou o lojista. Não negocie com empresas de cobrança, com “call centers”. Normalmente quem está do outro lado da linha não tem autonomia para fazer alguma coisa diferente do que receber o que está contratado. Vá diretamente ao banco ou à loja com documentos que comprovem o quanto recebe, para que possam juntos ajustar um plano de pagamento. Os credores em geral preferem receber algo com prejuízo do que não receber. 

Artigo publicado no Blog João Antônio Motta – UOL Economia – 27/02/2018