Com a criação do crédito consignado, os clientes dos bancos tiveram conhecimento de um mecanismo que está em todos os contratos bancários. Este mecanismo tem a ver com a simplificação do pagamento e praticidade ao cliente e ao banco. Em todos os contratos bancários, há uma cláusula que permite ao banco, no vencimento da prestação, entrar na conta corrente do cliente e pegar os valores necessários ao pagamento.
É exatamente por isso que o primeiro contrato que todo cliente assina com o banco é a abertura de sua conta corrente.
A situação fica tensa quando nesta mesma conta corrente você recebe seu salário.
Não é raro que as pessoas percam o fio da meada com os créditos que os bancos lhes oferecem. Logo que você abre a conta, o banco dá um limite de cheque especial de R$ 5 mil. No mesmo pacote não é raro você ter mais R$ 5 mil no cartão de crédito.
Havendo um problema no cartão, você refinancia um saldo devedor de R$ 7 mil e, aparentemente, tudo começa a andar bem novamente, pois com seu salário e as prestações caindo na conta, que continua com seu limite de crédito, os pagamentos estão sendo feitos e tudo parece bem.
Mas justamente por você todo mês ter um crédito depositado em conta, o banco não corta o limite total de seu cartão e lhe deixa ainda R$ 2 mil. Mais uma vez as contas vencem e você novamente tem de fazer um novo contrato para pagamento do saldo do cartão.
A partir daqui sua conta salário começa a ficar curta para os pagamentos, pois você tem o cheque especial para cobrir, o cartão de crédito e ainda 2 financiamentos, o que leva você a um problema maior. Seu limite de cheque especial é cortado.
Agora, você tem seu salário e ele não cobre as suas despesas e as dívidas contraídas com o banco.
Se você pensa na portabilidade da conta salário, a possibilidade de a transferir a outro banco, saiba que isso não é uma solução. O dinheiro que o seu banco original vai transferir ao novo banco só será liberado após o desconto das prestações devidas.
Uma chance seria transferir, junto ao empregador, a conta salário a outro banco, mas isso fica ao critério e conveniência do empregador e também pode ser uma missão impossível.
A saída é uma ação judicial? Sim e não. O cuidado a ser tomado é que o Tribunal que tem a última palavra sobre a questão, o Superior Tribunal de Justiça, modificou seu entendimento de que esta cláusula é abusiva e ainda vem confirmando a sua validade. A questão é que os descontos não podem impedir que o cliente bancário tenha a possibilidade de dar a si e sua família um sustento digno.
O STJ decidiu na semana passada que o salário, que legalmente é impenhorável, pode ser penhorado para o pagamento de dívidas desde que não retire do devedor a possibilidade de se sustentar e a sua família. A conclusão aqui deve ser no mesmo sentido: o banco só pode realizar débitos se não comprometer o sustendo do seu cliente e de sua família.
Artigo publicado no Blog João Antônio Motta – UOL Economia – 08/10/2018